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Nova Lei de Saúde Mental

O diploma, resultante de uma proposta elaborada por uma comissão de especialistas e apresentada pelo Governo à Assembleia da República, vem substituir a Lei de Saúde Mental de 1998, cuja revisão se justificava após mais de vinte anos de vigência, considerando, por um lado, os avanços registados, nesta área, a nível clínico, e, por outro, os compromissos assumidos por Portugal, relativamente a esta matéria, no âmbito da Organização Mundial de Saúde, do Conselho da Europa, da União Europeia e de outras instâncias internacionais. A Lei de Saúde Mental dispõe sobre a definição, os fundamentos e os objetivos da política de saúde mental, consagra os direitos e deveres das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental, regula as restrições dos seus direitos e estabelece as garantias de proteção da liberdade e da autonomia destas pessoas. O diploma reflete o quadro valorativo à luz do qual devem ser entendidas todas as abordagens terapêuticas neste domínio, baseadas na dignidade da pessoa humana.

O que muda

Com vista a assegurar a efetividade dos direitos de que é titular, prevê-se que a pessoa com necessidade de cuidados de saúde mental seja apoiada ou representada, no exercício dos mesmos, consoante os casos, pelo acompanhante (ao abrigo do regime do maior acompanhado), pelo procurador de cuidados de saúde, pelo mandatário, pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, a tutela ou a quem tenha sido confiada.

Nesse contexto, prevê-se na nova lei a figura, intencionalmente informal, da pessoa da confiança — pessoa escolhida por quem tem necessidade de cuidados de saúde mental e por si expressamente indicada para, com a sua concordância, lhe prestar apoio no exercício dos seus direitos. Adicionalmente, o respeito pelas pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental implica ver respeitadas a sua vontade e preferências, que podem ser expressas antecipadamente sob a forma de diretivas antecipadas de vontade.

Outra mudança prende-se com os requisitos e condições para o tratamento involuntário, o qual substitui o internamento compulsivo. Nos termos da nova Lei de Saúde Mental, a sujeição de cidadãos com doença mental a tratamento involuntário pode ser determinada em caso de recusa do tratamento medicamente prescrito, necessário para prevenir ou eliminar um perigo para bens jurídicos do próprio ou de terceiros.

O tratamento involuntário só pode ter lugar se for a única forma de garantir o tratamento medicamente prescrito, devendo ser adequado a prevenir ou eliminar uma das situações de perigo referidas e ser proporcional à gravidade da doença mental, ao grau do perigo e à relevância do bem jurídico.

O tratamento tem finalidade terapêutica, sendo orientado para a recuperação integral da pessoa, mediante intervenção terapêutica e psicossocial, visando a (re)capacitação, o (re)empoderamento, a reposição da autonomia da pessoa que recusa o tratamento que lhe está medicamente indicado, como forma de evitar consequências irreversíveis para a sua saúde mental, bem como a de prevenir a prática de crimes. Em coerência com a finalidade que lhe é apontada, a pessoa em tratamento involuntário participa, na medida da sua capacidade, na elaboração e execução do respetivo plano de cuidados e é ativamente envolvida nas decisões sobre o desenvolvimento do processo terapêutico.

A lei estabelece uma preferência pelo tratamento involuntário em ambulatório, assegurado pelos serviços locais de saúde mental e/ou equipas comunitárias de saúde mental, exceto se o internamento for a única forma de garantir o tratamento medicamente prescrito, cessando logo que o tratamento possa ser retomado em ambulatório.

A decisão de determinar o tratamento involuntário é uma decisão judicial, necessariamente fundamentada e baseada em avaliação clínico-psiquiátrica.

Impacto no sistema de saúde forense

A nova Lei de Saúde Mental procede também à revogação do n.º 3 do artigo 92.º do Código Penal, que, até agora, permitia, em certos casos, a prorrogação sucessiva das medidas de segurança de internamento de cidadãos inimputáveis. A subsistência de tal regime era há muito questionada, por permitir que as medidas de internamento pudessem ter, na prática, duração ilimitada ou mesmo perpétua.

Assim, com a entrada em vigor da nova lei, cessarão as medidas de segurança de internamento que, à data, já tenham ultrapassado a duração máxima da pena prevista para o tipo de crime. De acordo com o levantamento elaborado pelos serviços de internamento, estima-se que 46 pessoas estejam nessa situação na data da entrada em vigor do diploma. A cessação da medida depende, contudo, de determinação judicial.

Com vista a preparar a entrada em vigor do novo regime, o Governo estabeleceu uma articulação estreita entre as áreas governativas da Justiça, da Segurança Social e da Saúde, definindo uma metodologia através da qual foi feito o levantamento de todos os casos em relação aos quais era previsível a cessação da medida, caracterizando-se a situação clínica e social de cada um desses cidadãos através de uma abordagem multidisciplinar, congregando as informações da área da Reinserção Social, da Saúde Mental e da Segurança Social.

Com base nessa caracterização, procurou-se definir a resposta mais adequada às capacidades e necessidades de cada um dos cidadãos. As respostas podem passar pela reinserção em meio familiar, pela instalação em estruturas residenciais, seja para pessoas idosas, seja para pessoas com deficiência, diferentes tipologias de respostas habitacionais, pela colocação em instituições de saúde ou em unidades da rede de cuidados continuados integrados de saúde mental.

No caso das pessoas que necessitem de manter acompanhamento de saúde mental, este será sempre assegurado pelos serviços locais de saúde mental da área da residência. Nos casos em que, devido à doença mental e à recusa de tratamento, a pessoa possa representar um perigo para bens jurídicos, próprios ou alheios, poderá ser decretado por um tribunal uma medida de tratamento involuntário, incluindo internamento involuntário, ao abrigo da Lei de Saúde Mental, nos termos acima descritos.

No caso de pessoas que, por razões de idade, saúde, deficiência ou pelo seu comportamento se encontrem impossibilitadas de exercer pessoal, plena e conscientemente os seus direitos, podem beneficiar do Regime do Maior Acompanhado, aprovado pela Lei nº 49/2018 de 14 de agosto, que permite aos tribunais decretar as necessárias medidas de acompanhamento, nomeadamente designar pessoa ou pessoas encarregadas do acompanhamento, ou seja, incumbidas de as ajudar ou representar na tomada de decisões de natureza pessoal ou patrimonial.

Consulte o Comunicado de Imprensa e as Perguntas Frequentes acerca deste tema